NÃO INTERESSA A NINGUÉM, MAS...

São Paulo 450 anos

No dia 25 de janeiro de 2004, a cidade de São Paulo completou 450 anos. Houve, então, um notável o esforço de todas as emissoras de televisão para mostrar o quanto é simpático, agradável e divertido ser paulistano. Tal atitude talvez tenha sido a maior propaganda enganosa da história do município.

De todas as homenagens, a mais equivocada foi feita pelo Fantástico. Foi criado um quadro com a apresentação da onipresente Regina Case. São Paulo de Piratininga, criado por Estevão Ciavatta e João Carrascosa, da Pindorama Filmes, tinha como idéia principal desbravar a cidade de São Paulo percorrendo trilhas da mesma forma que fizeram os bandeirantes.

Foram escolhidos quatro viajantes urbanos: Sarita (uma jovem de classe média alta de Perdizes), Cristiane (uma jovem de família de imigrantes italianos), Alexandre (filho de japoneses, designer) e Sérgio (filho de baianos, motoboy) Eles receberam o nome de urbenautas. O termo "urbenauta" é uma criação do jornalista Eduardo Fenianos (autor do livro Expedições Urbenauta, São Paulo, Uma Aventura Radical) que, desde 1997, desenvolve o projeto do mesmo nome.

Os urbenautas foram abandonados à própria sorte no meio de São Paulo. Sem dinheiro, iriam precisar conseguir locais para comer e dormir, contando apenas com a hospitalidade e a simpatia da população. Como o arguto Zeronauta já percebeu, isso não poderia dar muito certo. E não deu mesmo.

O fato é que as mulheres urbenautas foram sempre bem-tratadas. O japonês Alexandre enfrentou algumas dificuldades, mas conseguiu seus objetivos. Agora, Sérgio sofreu mais do que torcedor do América do Rio de Janeiro. Por ser negro, pobre, filho de baianos foi alvo de várias manifestações de racismo. Algumas veladas outras abertas.

O povo paulistano mostrou toda sua simpatia com Sérgio. Ele lutava para conseguir um lugar para dormir. Era sistematicamente expulso por todos os amáveis e dóceis paulistanos. Em seus rostos uma mistura de ódio e medo do que aquele motoboy poderia fazer com suas famílias.

A situação foi ficando tão absurda que Sérgio foi obrigado a procurar refúgio em um cemitério. O administrador do local relutou, pensou muito e resolveu dar uma chance ao motoboy. Ele poderia usar o sofá de um velório para dormir. “O local é público, dorme aí que ninguém vai te expulsar”, explicou. Nada como a solidariedade dos paulistanos...

Sérgio ainda faz um comentário que resume de maneira perfeita os 450 anos de São Paulo. “Já que os vivos me negaram ajuda, vim buscar socorro com os mortos”, criticou o motoboy. Depois dessa declaração contundente, o programa termina com Regina Case cantando parabéns a você e exaltando a solidariedade e o carinho (sic) do povo paulistano!

Por favor... São Paulo pode ser a maior cidade do Brasil, pode ter os melhores restaurantes, pode ser um pólo tecnológico, mas solidária, amigável e companheira ela não é. Os paulistanos sabem que vivem em um moedor de carne humano. Daqui a 50 anos, quando o abastecimento de água do município estiver definitivamente comprometido, provavelmente começarão a matar uns aos outros. E, aí sim, a Rede Globo vai ter algo interessante para transmitir nos 500 anos de São Paulo...

Da Equipe de Articulistas

Lembre-se:
Se você acha maior desejo do verdadeiro paulistano é sair de São Paulo, então você é um pouco ZeroZen...