Acústico Rita Lee: O óbvio ululante

Os acústicos da MTV são previsíveis como feijão com arroz, todos parecem seguir a mesma fórmula: um artista consagrado, uma produção luxuosa, arranjos pasteurizados, várias participações especiais, e ainda uma cover ou uma música inédita para não ter aquela coisa de disco ao vivo sem nenhum material inédito.

Não se pode negar que essa fórmula tem dado certo, como se viu nos acústicos da Gal Costa e dos Titãs, que alcançou a incrível marca de mais de um milhão de cópias vendidas e teve até volume dois. Por isso mesmo não havia grandes esperanças de que este acústico Rita Lee fosse diferente, afinal como diz o dito popular de onde menos se espera é que não sai nada mesmo.

Mas o acústico Rita Lee consegue ser uma decepção maior, é talvez o pior que a emissora já tenha apresentado, perto deste o acústico dos Titãs se transformou num disco ousado e sem concessões. A escolha errônea do repertório, calcada nas composições da fase mais comercial e menos roqueira da cantora , aquela com seu marido e mala sem alça Roberto de Carvalho, tirou qualquer chance, se é que havia alguma, deste acústico ser interessante.

Não é preciso ir muito longe para descobrimos quem é o culpado disto, afinal Roberto de Carvalho, sempre ele, não só assina a direção musical como faz todos os arranjos do show.

Rita que já tinha feito um acústico antes, o interessante Bossa’n’roll de 1990, fora dos padrões da MTV. Desta vez a cantora resolveu jogar pelas regras da casa. Ou seja sem se arriscar muito, buscando a aceitação popular e o sucesso fácil, com uma fórmula já consagrada, dentro da mediocridade galopante que impera na emissora.

Os poucos bons momentos do show é quando Rita revisa seus clássicos dos tempos da sua banda Tutti-Frutti como na faixa de abertura "Agora só falta você", do disco "Fruto Proibido" de 75, com certeza um dos dez melhores discos de rocks já feitos no Brasil. Do mesmo disco Rita toca ainda "Luz del Fuego" em parceira com Cássia Eller e a indefectível "Ovelha Negra" que fecha o cd.

Mas infelizmente Rita não se detém nesta fase de sua carreira tocando algumas poucas composições desta época, dando estranhamente preferência às baladas como a obscura "Coisas da Vida" do disco "Entradas e Bandeiras" de 76.

Já dos Mutantes Rita regravou apenas "Balada do Louco" de 72, até porque, ao contrário do que muita gente pode pensar, sua participação nos Mutantes era quase que meramente decorativa. Pois é sabido que quem fazia as coisas acontecerem na banda era o Arnaldo Baptista. Isso até ele enlouquecer lá pela metade dos anos setenta, justamente por causa do fim de seu casamento com Rita.

Mas a interpretação da cantora para música, reintitulada de "Balada da louca", é bastante fraca e pedante. Não conseguindo justificar a inclusão desta faixa no disco. Só serve para deixar com saudades dos seus bons tempos nos Mutantes e do Arnaldo Baptista.

A impressão que predomina no acústico é de preguiça, tanto que Rita das duas composições novas do cd, apenas "M Tê Vê" foi composta pela cantora, que não foi sequer incluída no especial para televisão e é uma espécie de bonus duvidoso e dispensável do cd. A outra é de seu filho Beto Lee, que também toca violão e guitarra no show. É dele a autoria da lamentável "Gosto de azedo" cuja letra não poderia ser mais azeda. Pois com um refrão como "eu sou o HIV que você não vê", se esse cara depender do seu talento de letrista para vencer na vida , vai continuar vivendo da mesadinha da mamãe. A música inclusive tem arranjo do maestro Rogério Duprat, pai do Tropicalismo, que infelizmente não estava nos seus melhores dias quando o compôs. O arranjo parece com trilha sonora de filme americano, e lembra demais Live and let die de Paul McCartney, mas na versão dos Guns’n’Roses(?!)...

Por outro lado as participações especiais comprometeram bem menos que nos acústicos anteriores como as desastrosas participações de Frejat e Herbert Vianna no da Gal Costa e da Marisa Monte e de Fito Paez no dos Titãs.

As participações de Cássia Eller, dos Titãs, todos os sete, que meio que ficaram sobrando no palco, Milton Nascimento e ainda Dominguinhos no Arcodeon e Armandinho no bandolin foram no mínimo corretas para não dizer discretas. Quem acabou se dando mal foi a Paula Toller que ao lado de Rita deixou claro a fragilidade de sua voz. Afinal ela pode ser linda e gostosa, mas daí ela ser uma boa cantora são outros quatrocentos e cinqüenta.

Talvez a grande razão do sucesso desses acústicos é que possibilita que um artista como Rita Lee atinja um público que nunca compraria um álbum da cantora. Neste ponto o acústico Rita Lee, a despeito de sua qualidade musical, deve seguir o mesmo caminho de sucesso dos anteriores, pois é fácil de ouvir e mais ainda de esquecer. Sabe como é: explica mas não convence.

Agora é especular qual vai ser o artista em franca decadência que será o próximo escolhido da série acústico.

Eu particularmente gostaria de ver o Camisa de Venus, quer banda mais decandente do que essa? Não que eu tenha algum interesse de ver as músicas da banda transpostas para uma versão acústica, mas unicamente para ver aquela platéia seleta da MTV sacudindo as jóias e fazendo o coro "bota pra fuder..."

Saulo Gomes